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Nelson D no Urukum Sarau no Sesc 24 de Maio (fotografia por Filipe Russo))
Título: Nelson D no Urukum Sarau no Sesc 24 de Maio. Ano: 2023. Técnica: Fotografia digital. Autoria: Filipe Russo.

Os povos originários de Abya Yala foram tornados, em seus próprios territórios, imigrantes nas e das Américas graças ao projeto colonial, sendo assim endodiaspóricos. Foram expulsos de seus territórios ancestrais, recuando biomas adentro, abandonando as regiões litorâneas e resistindo aos processos de urbanização. Nasce politicamente os povos indígenas das Américas quando os povos originários de Abya Yala resistem e refutam a tutela e a dominação do projeto colonial capitaneado, à época, pelos impérios da Europa Central, em particular os com sede em Inglaterra, França, Espanha e Portugal.

A consciência (política) de classe (indígena) é fundamental à retomada dos territórios simbólicos e materiais saqueados diaria e secularmente pelo projeto colonial. Os povos indígenas só são interessantes para os estados-nação a título de espólio e capital. Uma consciência indígena só pode ser desenvolvida coletivamente, por se tratar de luta política, e requer a crítica a esse modelo instrumentalista, objetificante, neoliberal e desrespeitoso com o qual temos sido socializades, comercializades e explorades.

O Estado Brasileiro tolera as culturas indígenas desde que permaneçam politicamente desativadas e incapazes de flanquear e desestabilizar o projeto colonial, o qual segue com seu curso e suas violências simbólicas e materiais, agora servindo a outros impérios com práticas cada vez mais sofisticadas, sutis e naturalizadas de espoliação. O lugar de fala ofertado aos povos indígenas pelo projeto colonial é o do folclore, o da história única de um indígena aldeado, coadjuvante e fiel escudeiro do protagonismo branco.

Dentre as Vitórias do Projeto Colonial pode-se destacar:

  1. A urbanização dos territórios ancestrais

  2. A ruralização (agropecuária, mineradora, madeireira e militar) dos territórios ancestrais

  3. O genocídio de milhares de indígenas

  4. O etnocídio de centenas de culturas, modos de vida, linguagens e línguas originárias

  5. O enriquecimento dos grandes centros europeus ao custo da miséria indígena, latino-americana e socio-ambiental

Dentre as Derrotas do Projeto Colonial pode-se destacar:

  1. As (sobre)vivências de indígenas isolades

  2. As (sobre)vivências de indígenas em contato recente com a branquitude

  3. As (sobre)vivências de indígenas aldeades

  4. As (sobre)vivências de indígenas autodeclarades em retomada ancestral nos contextos urbanos e rurais

  5. A emergência de coletivos e movimentos civis de resistência ao projeto colonial

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por Adriano e Filipe Russo


Quando se fala sobre reconhecimento de parentes em contexto urbano, uma parte das pessoas exige provas, fazem contestações e hipóteses maldosas sobre disputa de espaços e supostos recursos, quando a nossa ideia central não está contemplada pela disputa, nem pela concorrência.

O problema de trabalhar tão somente no campo das hipóteses é que isso gera discussões desgastantes e pouco a nada úteis, confrontos entre semelhantes e especulações que não se apoiam na realidade material e simbólica das cidades.


A realidade conjuntural em que vivemos é em si a prova da nossa hereditariedade, com evidências históricas e genéticas que se traduzem em nossos corpos (com ou sem a marcação de fenótipos amplamente publicizados), histórias e espiritualidades diversas - ainda que essas últimas, em última instância, sejam metafísicas e individuais, não deixam de possuir características oriundas do social e cultural, inclusive no nosso caso, com matriz indígena.

Não estamos situades entre japoneses de Okinawa, vietnamitas, filipinos ou indonésios. Então de onde vieram as nossas características?

Qual linhagem presente no Brasil nos caberia, se não a indígena?

Não existe a menor intenção de tomar espaços aldeados já antes estabelecidos, nem invadir como se fossem nossos desde o início.

Parentes aldeados, de fato, não nos devem nada e a recíproca é verdadeira. Porém reconhecemos a legitimidade de suas lutas e enxergamos em seu esforço de preservação cultural e étnica possibilidades de reconexão entre indígenas em diáspora.

O reconhecimento por uma comunidade étnica específica não é uma exigência para a identidade indígena mas para utilizar pública e amplamente o nome de um povo é necessário conexão, ter seu reconhecimento consagrado pelo povo em questão. A realidade em toda a América Latina é a dos nossos corpos, rostos e familiares, ainda que apagados e espoliados pelo projeto colonial. Por isso, a necessidade da retomada ancestral.


A realidade das cidades já é e é visceral. Não depende de juízos de valor! Devemos colocá-la em pauta em todos os espaços e comunidades interessadas.


Nascemos como nascemos: brancos demais para sermos negros e escuros demais para sermos brancos.


É importante dizer que o papel de retomada e reencontro com a sua cultura originária cabe a cada indígena autodeclarade, sendo de responsabilidade individual mesmo dentro de um coletivo e cada um realiza este caminho de retorno a um futuro ancestral no seu próprio ritmo e nas suas próprias possibilidades.

Então, como devemos nos chamar, parente?

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Recentemente saiu uma matéria sobre a “primeira indígena" a ser forçada a se casar com um branco no Brasil, Diacuí, da etnia Kalapalo. É uma história que aconteceu há 70 anos, e teve uma ampla cobertura da imprensa. É uma das narrativas revisitadas na exposição “Xingu: Contatos”, em cartaz em São Paulo, no Instituto Moreira Salles. Acontece que, Diacuí não foi a primeira indígena forçada a se casar com um homem branco. Pode ter sido, sim, a primeira a ter uma atenção da grande mídia, mas não a primeira forçada a se casar, e vou te falar o porquê.


Esta história não é diferente do processo que aconteceu com inúmeras famílias indígenas no Brasil inteiro, e é por isso que Diacuí não foi a primeira indígena a sofrer essa violência. Embora os matrimônios e as uniões, entre indígenas e portugueses, fossem um fenômeno antigo no Brasil, é importante notar que, a partir das reformas pombalinas os casamentos mistos se transformaram em uma política oficial do governo colonial, adquirindo novo significado político e social.


A meta era literalmente destruir os indígenas, como grupos étnicos e políticos diferenciados, dentro do contexto colonial. Ou seja, tratava-se de absorvê-los à população colonial e à sociedade envolvente, por meio da miscigenação biológica, e da homogeneização linguística e cultural.




O artigo 88 do Diretório Pombalino de 1755, século XVIII, deixa claro o objetivo assimilacionista ao incentivar à presença de não índios nas aldeias, os casamentos interétnicos, e a extirpação dos costumes indígenas, de maneira a transformar esses grupos em vassalos do rei de Portugal, sem distinção em relação aos demais.








Em 1758, o Diretório dos Índios foi estendido ao resto do Brasil. Era uma forma de dar continuidade e legitimação dos territórios lusos e sua eficaz ocupação, como também exigir a catequização e a união cristã monogâmica, de subalternizar a mulher indígena. Nessa época acreditava-se que era preciso acabar com o sangue dos “selvagens”, pois assim chegariam mais perto de uma raça dita “civilizada” com doses do sangue branco. Para quem quer saber um pouco mais, você pode encontrar este documento na Biblioteca Nacional.


Fontes:

  • Casamentos indígenas, casamentos mistos e política na américa portuguesa: amizade, negociação, capitulação e assimilação social. Vânia maria losada moreira. universidade federal rural do rio de janeiro, brasil.


  • O Diretório dos Índios como projeto de “civilização” portuguesa para os sertões pernambucanos. Elba Monique Chagas da Cunha. Revista Latino-Americana de História. Vol. 3, no. 12 – Dezembro de 2014

  • Diacuí: a fotorreportagem como projeto etnocida1 . Helouise Costa . Docente do Museu de Arte Contemporânea da Universidade de São Paulo

  • https://revistamarieclaire.globo.com/retratos/noticia/2023/02/estupro-e-uniao-forcada-o-caso-de-diacui-primeira-indigena-a-se-casar-com-um-branco-no-brasil.ghtml em 01/03/2023

  • https://lisa.fflch.usp.br/taxonomy/term/1231 . 01/03/2023


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